A liderança indireta
O líder sábio fala pouco, mas age com coerência. Ele cumpre o que promete e dá espaço para que os outros cresçam. E quando tudo está concluído, a equipe dirá: “Nós conseguimos isso sozinhos!”
A liderança direta é um força importante nos ambientes de negócio e também nas nossas vidas pessoais, como discuti nesse post. Mas na maioria das situações, é impossível apenas emitir ordens e esperar que resultados aconteçam.
Precisamos buscar abordagens indiretas.
As abordagens indiretas
No livro Strategy: The Indirect Approach, o autor Liddell Hart reúne análises históricas milenares e modernas que fundamentam sua tese de que a maneira mais eficaz de vencer grandes conflitos não se baseia em confrontos diretos contra as forças inimigas em seus pontos mais fortes, mas em movimentações estratégicas que visam desarticular, cercar ou enganar o adversário.
Ainda no campo da estratégia, mas para organizações, vemos os ensinamentos de Hery Mintzberg, no seu clássico livro Safari de Estratégias. Mintzberg questiona o planejamento estratégico clássico para qualquer situação, sugerindo que a estratégia real emerge das interações, experimentações e iniciativas distribuídas nas equipes. As estratégias emergentes (indiretas) podem ser muito mais poderosas que as estratégias deliberadas.
Outra pensadora do campo da gestão, Mary Parker Follet, defendia o poder com (coletivo) em vez de poder sobre (hierárquico). Follett falava de controle e coordenação por meio de grupos auto-geridos e resolução de conflitos construtiva — uma forma de liderança que evita o embate frontal e busca convergências.
Finalmente, vemos o trabalho recente de John Kay, no seu livro Obliquity O autor argumenta que fenômenos como mercados, sociedades e relacionamentos humanos são sistemas complexos, onde inúmeros fatores interagem de modo imprevisível.
Liderança Indireta - Na prática
Algumas abordagens incluem:
Exemplo
Sinalização
Inspiração
Desenho de sistemas
Baseada em Cultura
Baseada em Empurrões Comportamentais
A liderança baseada no exemplo
Esse modelo é o velho conhecido dos pais e mães. Filhos aprendem muito mais através dos exemplos que observam dos seus pais do que através de ordens diretas. Um sábio disse uma vez que os erros dos filhos podem ser um reflexo dos próprios comportamentos dos pais e que estes têm a oportunidade de melhorar a si mesmos, servindo como modelos positivos e, assim, orientar seus filhos a se tornarem a melhor versão de si mesmos
Da mesma forma, líderes atentos fazem o mesmo em ambientes corporativos. Através da retidão e consistência de comportamentos, eles fornecem um exemplo a ser copiado e influenciam o seu meio.
A liderança baseada em sinais
Esse modelo é um velho conhecido dos tutores de cães. Animais realizam a leitura de sinais dos seus humanos o tempo todo. Um líder fraco deixa o cão entrar em um ambiente em primeiro lugar. Ou deixa o cão puxar a guia na rua. Isso sinaliza para o animal que ele é o responsável pela matilha (de humanos). É um exemplo prático de baixa liderança baseada em sinais.
Mas a liderança por sinalização pode ser um recurso poderoso, se bem usada. Não apenas para liderar cães. No ambiente corporativo, por exemplo. Um líder pode sinalizar que ele mantém suas câmeras abertas nas reuniões. Ou usar uma bermuda no escritório se quiser sinalizar ambiente descontraído e vestuário casual. Esses pequenos sinais são percebidos pelos liderados e geram cópia de comportamentos.
A liderança baseada em inspiração
Grandes lideranças contam histórias. Eles buscam inspirar seus liderados.
Tome Jesus, por exemplo. Pregava e liderava com o uso de parábolas e não através de fórmulas matemáticas sobre virtude e bondade.
Grandes comunicadores ou políticos buscam inspirar seus seguidores para promover ação, engajamento e comportamentos congruentes às suas crenças.
A liderança baseada em sistemas
Em um de seus trabalhos mais conhecidos, The Practice of Management, Peter Drucker argumenta que a função essencial do gestor não é simplesmente ditar tarefas. Ele deve construir condições para que uma organização alcance seus propósitos.
A construção de condições pode ser vista, na ótima do Pensamento em Sistemas, como o desenho de um "sistema tático". Esse sistema permite que os seus "jogadores" possam desempenhar suas funções com eficiência e eficácia. Uso aqui a metáfora do futebol para tornar óbvio que os melhores técnicos não está gritando na beira do gramado, mas aperfeiçoando como os jogadores devem se posicionar e mover nas diferentes condições de um jogo.
A liderança baseada em cultura
Em vez de impor regras formais sobre como se comportar, o líder busca construir (e reforçar) uma cultura que orienta de forma quase automática o que é certo ou errado, o que se valoriza e o que se rejeita.
Warner Burke, no excelente livro Organizational Change: Theory and Practice, enfatiza que as mudanças não acontecem apenas por meio de novas políticas, processos ou organogramas. Para Burke, a essência da mudança está na capacidade de traduzir valores em novos comportamentos — seja no modo de resolver problemas, na forma de conduzir reuniões ou nas relações diárias entre líderes e liderados.
A liderança por empurrões comportamentais
Esse modelo se vale do conceito de arquitetura de escolhas. Em vez de dar ordens explícitas, o líder organiza o ambiente (físico ou digital) de modo a influenciar comportamentos desejáveis.
É o que vemos, por exemplo, quando uma liderança de RH que orientar funcionários a se alimentar melhor. Ele coloca frutas e lanches saudáveis em locais visíveis e de fácil acesso da empresa, enquanto guloseimas ficam mais escondidas. As pessoas não são proibidas de comer doces, mas acabam optando naturalmente pelos alimentos dispostos à frente.
Como curiosidade, supermercados fazem o contrário. Eles "lideram" os seus consumidores a comprar as comidas mais rentáveis e menos saudáveis, que sempre ficam nas gôndolas centrais.
Um outro exemplo é um líder que faz reuniões diárias com um quadro Kanban que é lido sempre da direita para a esquerda, para provocar a equipe que é mais importante terminar coisas em andamento que abrir novos trabalhos. "Pare de começar e comece a terminar" é o comportamento sendo "empurrado" aqui.
Resumo - A liderança pode ser sutil
Gosto muito da passagem abaixo do Tao Te Ching, escrito há mais de 2500 anos. Ela sintetiza a essência da liderança indireta.
O melhor líder é aquele cuja presença mal se percebe.
O próximo melhor é aquele que é admirado e respeitado.
Depois, vem aquele que é temido.
E, por último, aquele que é ignorado ou desprezado.Se um líder não inspira confiança, sua equipe não confiará nele.
O líder sábio fala pouco, mas age com coerência.
Ele cumpre o que promete e dá espaço para que os outros cresçam.E quando tudo está concluído, a equipe dirá:
“Nós conseguimos isso sozinhos.”